Congresso deve levar a sério os ataques contra a democracia brasileira

February 15, 2017

Alexander Main
Nocaute, 8 de fevereiro, 2017

The Hill, 1 de fevereiro, 2017

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Não muito tempo atrás o Brasil estava “no topo do mundo”, como uma manchete de 2010 descreveu. Com uma economia em constante crescimento e expansão de programas sociais que tiraram milhões de pessoas da pobreza, a nação sul-americana era vista por muitos como um poder global emergente e um notável exemplo de boa governança e inclusão. Lula da Silva, presidente do Brasil de 2003 a 2010, recebeu amplo crédito pelo notável sucesso de seu país; o presidente Barack Obama o chamou de “o político mais popular da Terra”. Mas, nos últimos anos, o panorama econômico e político do Brasil mudou dramaticamente. As manchetes recentes incluem “Brasil em Queda Livre” e “A Hora Mais Escura”.

No início de 2014, a economia brasileira começou a declinar. As causas incluíam a desaceleração econômica latino-americana e global, mas também políticas econômicas neoliberais favorecidas pela poderosa comunidade financeira do Brasil, incluindo o aperto do orçamento e do crédito no momento errado e taxas de juros exorbitantes. Entretanto, surgiram revelações sobre um vasto esquema de suborno — comumente conhecido como “Lava Jato” — envolvendo a estatal Petrobras e inúmeras figuras importantes dos principais partidos políticos do Brasil. Essa tempestade perfeita de contratempos econômicos e políticos contribuiu para o rápido declínio da popularidade da sucessora de Lula, Dilma Rousseff, e criou uma oportunidade de ouro para que os setores de direita derrubassem Rousseff e seu Partido dos Trabalhadores. Mas ao invés de tentar retomar a presidência por meio de eleições, setores da direita conspiraram para remover Rousseff, desencadeando um processo de impeachment legalmente injustificado contra ela.

Em meio a massivos protestos contra o impeachment, o Senado do Brasil, dominado pela oposição, votou em 31 de agosto de 2016 para retirar Rousseff permanentemente do cargo. A partir do momento em que lograram efetivar o “golpe suave” — como muitos brasileiros o rotulam – os adversários do Partido dos Trabalhadores voltaram suas atenções para Lula, que continua sendo a figura política mais popular do Brasil. O ex-presidente é regularmente vilificado na mídia conservadora do Brasil, que domina as mídias escritas e faladas do país. Sergio Moro, o juiz federal afeito aos holofotes, que foi elevado ao status de um quase super-herói por grande parte dos principais meios de comunicação do Brasil, tem conduzido uma investigação tendenciosa e politizada que tem Lula como alvo, violando repetidamente os direitos do ex-presidente.

A administração Obama falhou em se manifestar contra esses ataques à democracia brasileira, mas membros do Congresso dos Estados Unidos tomaram conhecimento do processo de impeachment de Rousseff, iniciado em maio de 2016, e apelaram vigorosamente para que se respeitasse o Estado de Direito e os direitos humanos no Brasil.

Em julho de 2016, 43 deputados Democratas da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos enviaram uma carta ao então secretário de Estado, John Kerry, expressando “forte preocupação” com o impeachment de Rousseff e observando que seus principais promotores enfrentavam acusações de corrupção, incluindo Romero Jucá, um aliado-chave de Temer que foi gravado planejando a remoção de Rousseff. O objetivo, segundo Jucá, era impedir que investigações de corrupção avançassem.

O substituto de Rousseff, o vice-presidente conservador Michel Temer, nomeou prontamente um gabinete composto somente de homens brancos, que iniciou reformas com consequências de longo prazo que incluem cortes drásticos em programas sociais.

No início de agosto, o senador Bernie Sanders emitiu uma declaração afirmando que: “Os Estados Unidos não podem ficar em silêncio enquanto as instituições democráticas de um dos nossos aliados mais importante são minadas”.

O secretário Kerry ignorou esses apelos. Em 5 de agosto, enquanto o julgamento de impeachment ainda estava em andamento, ele participou de uma amistosa coletiva de imprensa com o ministro das Relações Exteriores de Temer e não fez menção alguma dos esforços inconstitucionais para remover Rousseff. O sinal para os brasileiros era inconfundível: Washington apoiou o que muitos consideravam um golpe de Estado ilegal.

Embora o Brasil tenha praticamente desaparecido dos noticiários nos EUA, a nefasta situação política e social ainda é motivo de grande preocupação para alguns membros do Congresso.

Em 18 de janeiro, doze membros da Câmara, incluindo quatro dos cinco principais Democratas da Comissão de Justiça e líderes da bancada progressista, enviaram uma carta ao embaixador do Brasil em Washington, denunciando a repressão à protestos pacíficos no Brasil e a criminalização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e outros grupos que fazem oposição ao governo Temer. A carta também denuncia a contínua perseguição judicial a Lula:

Desde o início de [2016], Lula foi alvo de um juiz — Sergio Moro — cujas ações tendenciosas e injustificadas comprometeram gravemente os direitos legais de Lula. Por exemplo, Moro ordenou a prisão arbitrária do ex-presidente simplesmente para servir uma intimação, embora não houvesse nenhuma indicação de que o ex-presidente não estivesse disposto a prestar testemunho. Os meios de comunicação estavam no local quando a prisão ocorreu, sugerindo que o principal objetivo da detenção era criar a percepção de que Lula estava envolvido em atividades criminosas, apesar da falta de acusações formais contra ele na época.

A carta descreve a participação aberta de Moro “em acontecimentos políticos de oposição a Lula” e seu endosso de um livro sensacionalista que o vangloria e que apresenta Lula como culpado de alegadas acusações criminais. Também observa que Moro vazou interceptações telefônicas para a mídia – uma violação da lei brasileira.

A carta, liderada pelo congressista John Conyers e endossada por AFL-CIO, Friends of the Earth e outras organizações, continua:

Mesmo após a obtenção de testemunhos contra Lula através de acordos de delação premiada, ainda não há provas críveis que envolvam Lula em atividades criminosas. Preocupa-nos que o verdadeiro objetivo do processo seja o de prejudicar gravemente a imagem de Lula e inviabilizá-lo politicamente por qualquer meio, como ocorreu com a ex-presidenta Rousseff.

A despeito desses ataques, o Partido dos Trabalhadores anunciou, em 17 de janeiro, que Lula seria seu candidato à Presidência nas eleições de 2018 no Brasil. Dois dias depois, Teori Zavascki, juiz do Supremo Trubunal Federal, morreu em um acidente aéreo visto por muitos como suspeito, já que Zavascki estava analisando testemunhos que poderiam implicar muitos políticos brasileiros poderosos em corrupção.

Zavascki era amplamente considerado como o membro mais independente e com princípios da Corte. Ele havia sido identificado na gravação vazada de Jucá como o único juiz “fechado” para fazer um acordo para ajudar a remover Rousseff. E ele havia protestado firmemente contra os vazamentos das gravações de conversas telefônicas de Lula no início de 2016, o que lhe causou ataques viciosos na mídia conservadora e protestos em frente à sua casa em São Paulo.

Com a perda de Zavascki, parece improvável que qualquer juiz de instâncias superiores vá intervir para combater os excessos de Moro e de outros que usam seu poder judicial ou político para atacar arbitrariamente seus adversários. Diante dessa situação alarmante, é mais importante do que nunca que os membros do Congresso e outros membros da comunidade internacional lancem luz sobre a tentativa de demolição da democracia e dos direitos básicos que está ocorrendo no Brasil.


Alexander Main é Associado Sênior de Política Internacional do Centro de Pesquisa Econômica e Política, em Washington, DC. 

Tradução por Aline Piva.

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