As autoridades europeias estão a destruir a economia grega para “salvá-la”?

April 02, 2015

Mark Weisbrot
Esquerda.net, 2 de abril de 2015
Al Jazeera America, 30 de março de 2015

Veja o artigo na fonte original.

em Inglês

Existe atualmente um impasse tenso entre o governo grego e as autoridades europeias – às vezes conhecidas como a troika porque incluem a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI). O presidente do BCE, Mario Draghi, negou esta semana que a sua instituição esteja a tentar chantagear o governo grego.

Mas falar em chantagem é realmente dizer pouco do que o BCE e os seus parceiros europeus estão a fazer à Grécia. É cada vez mais claro que estão a tentar prejudicar a economia grega de forma a aumentar a pressão para que o novo governo aceite as suas exigências.

O primeiro sinal de que esta era a estratégia das autoridades europeias veio em 4 de fevereiro – apenas dez dias após o governo do Syriza ser eleito – quando o Banco Central Europeu cortou a principal fonte de financiamento dos bancos gregos. Esta medida foi claramente tomada de má fé, já que não existia um motivo burocrático ou outro para fazê-lo; foi mais de três semanas antes do prazo para a decisão. Previsivelmente, o corte estimulou uma grande fuga de capitais do sistema bancário grego, desestabilizando a economia e provocando a queda a pique dos mercados financeiros. Seguiu-se mais intimidação, incluindo uma velada ameaça de que a Emergency Liquidity Assistance – a última linha de crédito do BCE à Grécia – também poderia ser cortada. As autoridades europeias parecem esperar que um assalto do tipo “choque e pavor” à economia grega force o novo governo a capitular imediatamente.

Não funcionou. O partido Syriza tem um mandato do eleitorado grego para melhorar os seus padrões de vida depois de seis anos de depressão induzida pela Troika e mais de 25% de desemprego. O novo governo grego recuou da sua exigência de fazer um “haircut” da dívida, e fez outros compromissos, mas não iria simplesmente render-se, como se não tivessem ocorrido eleições. As autoridades europeias finalmente piscaram em 20 de fevereiro e aceitaram conceder uma extensão de quatro meses, até junho, do anterior “resgate” – as aspas são necessárias porque a maioria dos gregos não foram “resgatados”, mas antes atirados borda fora, tendo perdido mais de 25% do seu rendimento nacional desde 2008.

A condição imediata para o acordo de 20 de fevereiro foi que o governo grego apresentasse uma lista de reformas com as quais se comprometesse, o que fez, e que fossem aprovadas pelas autoridades europeias. As questões restantes seriam negociadas até 20 de abril, de forma que a parcela final do dinheiro do FMI – cerca de 7.200 milhões de euros – fosse entregue. Poder-se-ia assumir que o acordo de 20 de fevereiro iria permitir que estas negociações ocorressem sem que as autoridades europeias causassem mais prejuízos, imediatos e desnecessários, à economia da Grécia. Mas não: uma pistola apontada à cabeça do Syriza não era suficiente para estes “benfeitores”; queriam também que a cabeça ficasse no cepo.

E conseguiram. O BCE recusou-se a renovar o acesso dos bancos à sua principal e mais barata fonte de crédito, acesso que tinham antes das eleições de 25 de janeiro. E recusou-se a subir o limite do montante que os bancos gregos podiam emprestar ao governo grego – uma medida que não tinham tomado em relação ao governo anterior. O resultado foi criar um problema sério de fluxo de caixa tanto para o governo quanto para os bancos. Devido ao aperto de crédito do BCE, o governo poderia rapidamente ver-se numa situação semelhante à que o governo de 2012 enfrentou, quando atrasou os pagamentos aos hospitais e a outros serviços públicos para poder fazer pagamentos da dívida; e poderia mesmo enfrentar o default no final de abril.

Os montantes de dinheiro envolvidos são bastante triviais para o Banco Central Europeu. O governo tem de reunir cerca de 2.000 milhões de euros de pagamentos de dívida em abril. O BCE desembolsou recentemente 26.300 milhões de euros para comprar títulos dos governos da Eurozona, como parte do seu programa de 850.000 milhões de euros quantitative easingpara o próximo ano e meio. As desculpas do BCE para causar esta crise de liquidez na Grécia soam a vazio: por exemplo, argumenta que os bancos, sob o governo anterior, não tinham de ter o limite que o BCE está a impor-lhes agora porque o anterior governo se comprometera com um programa de reformas que iria consertar as suas finanças. Mas o atual fez o mesmo.

Dificilmente seria mais óbvio que a questão não é dinheiro ou sustentabilidade fiscal, mas política. As autoridades europeias querem mostrar quem manda. Além disso, este é um governo que eles não queriam. E não pretendem ver o sucesso deste governo, que encorajaria os eleitores espanhóis a optar por uma alternativa democrática (Podemos) no fim deste ano.

O FMI tinha projetado um crescimento de 2,9% da economia este ano, e até meados do mês passado havia boas razões para acreditar que – tal como em 2014, depois de anos de previsões sobrestimadas – esta previsão seria certeira. Este crescimento teria provavelmente mantido altos os índices de aprovação do Syriza, junto com as suas medidas de fornecer alimentos e eletricidade aos lares mais necessitados e outras mudanças progressistas. As ações do BCE, ao desestabilizarem a economia e desencorajarem o investimento e o consumo, provocarão o atraso da retoma na Grécia, e podem também significar a erosão do apoio ao governo.

Se levadas demasiado longe, as ações das autoridades europeias podem também inadvertidamente forçar a saída da Grécia do euro. É uma estratégia perigosa, e se realmente o objetivo fosse a Grécia atingir a sustentabilidade fiscal, deveriam parar de minar a recuperação económica.

Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net


Mark Weisbrot é codiretor do Centro para a Investigação Económica e Política, em Washington, DC e presidente da Just Foreign Policy. Também é o autor do livro a ser publicado em breve “Failed: What the “Experts” Got Wrong About the Global Economy” (Oxford University Press, 2015).

 

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